sábado, 13 de fevereiro de 2010

Adeus

Já gastamos as palavras pela rua, meu amor,
E o que nos ficou já não chega
Para afastar o frio de quatro parades.
Gastamos tudo menos o silencio.
Gastamos os olhos com o sal das lagimas,
Gastamos as mãos à força de as apertarmos,
Gastamos o relogio e as pedras das esquinas
Em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tinhamos tanto para dar um ao outro;
Era como se tudas as coisas fossem minhas:
Quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos sao peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
Porque ao teu lado
Tudas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
Era no tempo em que os meus olhos
Eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
Uns olhos como tudos os outros.

Já gastamos as palavras.
Agora quando digo: meu amor,
Já não se passa nada.
No entanto, antes das palavras gastas,
Tenho a certeza
De que tudas as coisas estremeciam
Só de murmurar o teu nome
No silênio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
Não há nada que me peça água.
O passado é inutil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

Eugénio de Andrade



[Um dos poemas mais bonitos e que expressa melhor os sentimentos, do meu autor preferido!!Para aquela pessoa a quem nunca quero dizer adeus...]

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